Carta Compromisso dos Participantes do Seminário Laudato SÌ e Rede Eclesial Pan-Amazônica em Zé Doca, no Maranhão, dioceses de Zé Doca, Coroatá, Pinheiros, Caxias do Maranhão, Brejo, Bacabal, Viana e arquidiocese de São Luís.
Nós, representantes de diversos povos e comunidades, movimentos, dioceses e igreja presbiteriana, nos reunimos entre os dias 17 a 19 de fevereiro de 2017 na cidade de Zé Doca (MA), em seminário promovido pela Comissão Episcopal para a Amazônia da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam), e organizado pelo Regional Nordeste 5 CNBB no intuito de fortalecer essa Rede em defesa da vida dos povos da terra, da Casa Comum, o Planeta Terra e o nosso bioma amazônico.
Ouvimos relatos de violências sofridas, resistências e insurgências organizadas pelos povos tradicionais: a cobrança dos povos Gamela e Guajajara, secularmente expulsos de seus territórios; pescadores e ribeirinhos violentados pela implantação de parques eólicos; quilombolas e quebradeiras de coco despojados de seus lugares de vida, trabalho e produção; mulheres afetadas por tráfico humano e outras formas de violência; comunidades destruídas por projetos de mineração; jovens sem estudo e sem trabalho, sofrendo mortes prematuras tendo suas perspectivas de futuro prejudicados.
Nos debates, concluímos que o atual modelo de desenvolvimento implantado em nosso Estado, em nada beneficia a grande maioria da população. Tendo índices crescentes de seu Produto Interno Bruto (PIB), este “progresso” não resultou em melhorias de condições de vida para o povo. Continuamos vivendo num sistema colonial, onde as decisões sobre o nosso futuro são tomadas por empresas invasoras dos nossos territórios e com formas de exploração das riquezas naturais, que comprometem em pouco tempo a Amazônia Legal, sobretudo, atingido pelo Projeto MATOPIBA, programa federal que abrange os Estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, ameaça destruir 73 milhões de hectares do bioma cerrado. Vivemos num renovado sistema de escravidão por dívidas, em que o povo paga uma dívida pública que ele não contraiu.
Promovido pelo capitalismo, somos enganados e levados a um consumo de supérfluos e descartáveis, alienando-nos da nossa cultura do alimento saudável, da vida simples e das relações de solidariedade. Nos é imposto um modo de viver que não é nosso. Não queremos para a Amazônia um modelo de desenvolvimento que, em nome do progresso, mata e diminui a vida.
Fomos fortalecidos pelas palavras de ânimo, de incentivo à resistência e à ação do papa Francisco na sua Carta Encíclica Laudato Sí. O Papa se dirige explicitamente para a nossa região Pan-Amazônica, quando nos alerta que ainda é tempo de reagir contra a espoliação danosa do nosso bioma. “Com efeito, há ‘propostas de internacionalização da Amazônia que só servem aos interesses econômicos das corporações internacionais’. É louvável a tarefa de organismos internacionais e organizações da sociedade civil que sensibilizam as populações e colaboram de forma crítica, inclusive utilizando legítimos mecanismos de pressão, para que cada governo cumpra o dever próprio e não delegável de preservar o meio ambiente e os recursos naturais de seu país, sem se vender a espúrios interesses locais ou internacionais” (LS 38).
Os governos não estão preocupados com os destinos dos povos que tradicionalmente habitam as terras maranhenses. Servir aos interesses exclusivos das empresas que vêm de fora, até de outros países, sem escutar e levar em consideração as justas reivindicações dos povos locais, parece estar na base da sua política desenvolvimentista e entreguista.
Diante dessa realidade, cobramos:
- Que sejam ouvidos os clamores dos povos que há séculos cultivam as terras, respeitando a biodiversidade e que mostram por suas práticas que há alternativas ao desenvolvimento sustentável;
- Que sejam discutidos projetos de desenvolvimento com as populações afetadas, mostrando todas as informações e os relatórios de impactos socioambientais, mantidos frequentemente em segredo, apesar da Lei de acesso à Informação;
- Que o governo escute o povo mais do que discursem sobre seus planos e projetos.
Nos propomos:
- Fortalecer a Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam), criando um comitê regional com representação das dioceses e articulação das pastorais sociais, com apoio do secretariado regional da CNBB Nordeste 5 (NE5);
- Reconhecer e fortalecer as lutas locais nos territórios dos diferentes povos: indígenas, quilombolas, sertanejos, pescadores artesanais, geraizeiros, quebradeiras de coco, entre outros;
- Participar das manifestações sociais em defesa dos direitos dos trabalhadores e povos;
- Dar atenção especial às lutas e iniciativas de mulheres como suas manifestações, como por exemplo, no Dia Internacional da Mulher;
- Apoiar as juventudes na suas lutas e reivindicações por direitos e futuro digno e a Pastoral da Juventude na luta contra a reforma do Ensino Médio, a realização da Romaria Regional da Juventude que traz o tema “Juventude e Ecologia” e o repúdio ao Projeto MATOPIBA.
Zé Doca, 19 de fevereiro de 2017
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